ROQUE
ZIMMERMANN - UMA ABORDAGEM FILOSÓFICA A PARTIR DE ENRRIQUE DUSSEL
NAYARA DOS SANTOS DE SANTANA
1 – UMA BREVE BIOGRAFIA
Enrique
Dussel nasceu no dia 24 de dezembro 1934 em uma pequena e pobre aldeia da
província de Mendoza, Argentina, próxima aos Andes. Filho de médico – portanto
situação privilegiada em relação ao povo de seu meio.
Em
1940, após a demissão de seu pai, Dussel muda com a família para a capital,
Buenos Aires, mas voltam a morar em Mendoza. Militou na Ação Católica de sua
cidade, foi líder estudantil e membro da democracia cristã. Militava em grêmios
e movimentos políticos, e devido sua oposição a Péron foi preso em 1954. É
evidente dizer que esses fatos marcam seus escritos futuros.
Formou-
se em Filosofia na Universidade Nacional de Cuyo, licenciou- se aos 23 anos e
partiu para a Espanha com uma bolsa de estudos. Volta à Espanha e termina seu
doutourado em 1959.
Na
França, em 1961, cursa bacharelado em Teologia e escreve o Dualismo na
Antropologia da Cristandade; nesta época trabalhava como bibliotecário
universitário na Sorbone. Em 1969 assume a cadeira de ética na
Universidade Nacional de Cuyo, que ocupará até 1975. Aqui entra em contato com
duas correntes filosóficas distintas – a racionalista – representada por Nímio
de Aquim e Francisco Romero – o marxista, por Carlos Astrada, e a neotomista –
cujos principais expoentes são Ismael Quiles, Octávio Derisi, Juan Sepich e
Alberto Caturelli.
O
próximo passo será a Espanha (1957-1959), onde continua sua formação filosófica
e onde começa a ver a América Latina como uma totalidade a partir de fora. Sua
vocação latino- americana vem desta época. Após rápido, mas muito importante
contato com a Itália, Grécia e Oriente Médio, termina o doutorado em filosofia
(1959), em Madrid, ‘na Escolástica mais tradicional’, a única admitida pelo
regime franquista e a Igreja católica da Espanha.
Entretanto,
o que marca efetivamente Dussel são os dois anos que passará em Israel
(1960-1961), onde volta para ‘realizar seu projeto de peregrinação às fontes’,
sem perder de vista o horizonte da América Latina.
De
fato, foi nas montanhas de Damasco que, em 1964, iniciou O Humanismo Semita, obra publicada só em 1969, tendo já então
retornado a sua pátria. Nela antecipa o descobrimento do pobre, do outro, do
oprimido. Interna- se no Oriente Médio para ‘descobrir o ethos do homem do deserto o ancestral do espanhol, do crioulo da
América Latina…’. O descobrimento do pobre, do oprimido , do homem do povo
marca daí para frente todo o pensamento do escritor, seja ele filosófo,
historiador ou teólogo que é Enrique Dussel. Já em 1961, num dos seus primeiros
artigos publicados, o tema do pobre é explícito.
Nos
vários meses que esteve na Grécia aperfeiçoou os seus conhecimentos de grego
clássico, o que lhe permite, a partir de então, manusear os filosófos helênicos
no original, com grande desembaraço. Foí aí também que iniciou a obra El humanismo helênico (1969), publicado
em 1975.
De
volta à França, licenciou- se em Teologia no Instituto Católico de Paris.
Conheceu Claude Tresmontant ‘cuja generosa amizade nos permitiu penetrar com
simpatia no pansamento hebreu e cristão primitivo’. Nessa época, iniciou a
redação de El dualismo en la antropología
de la cristiandad, porque ‘queria unir o pensamento grego ao latino-
americano’, nos diz o próprio Dussel.
Dussel,
desde o começo de seu magistério valoriza como fato o elemento religioso
fortemente presente na estrutura do homem latino- americano.
Terminada
esta longa fase de preparação, já marcada com a elaboração de alguns escritos
importantes, vemo- lo, em 1966, de regresso à Argentina. Contiua agora no campo
específico da filosofia, na paisagem própria da América Latina.
Dussel
em meio a conturbada tranformação política da Argentina, segue ensinando na
universidade e na rua, sempre questionando e criticando, por isso incomoda. A
reação a semelhante postura não tardou. Na noite de outubro de 1973 a casa de
Dussel foi dinamitada a mando da direita peronista. Felizmente não houve
vítimas fatais. Mas este fato marcou muito a Dussel. Já então acusado de
marxismo, finalmente em março de 1975, Dussel é expulso da Universidade
Nacional de Cuyo. Dussel toma o caminho do exílio. Em 1976 Dussel é exilado no
México, onde consegue lecionar na Universidade Autônoma do México.
É
neste contexto, em 1977, são transcritos as conferências de Dussel e nasce Uma filosofia da libertação Latino -
Americana.
A
Filosofia da Libertação de Dussel teria o propósito de libertar filosófico-
politicamente as sociedades latino- americanas. Libertar a filosofia da
supremacia européia, pois possuimos valores, crenças distintos àquela. E
desejando também uma libertação política da dominação e exploração européia.
2 – O NÃO- SER EM DUSSEL
Perguntamos
o que é/ou quem é o ser?, os antigos em resposta diziam - ‘o ser se diz de
muitas maneiras’, para filosofia da libertação o ser é o Outro- o ignorado, o
negado, como é vista a América Latina em relação ao centro europeu. A América
Latina só pode ser vista como ser a
partir da alteridade, isto é, a partir da aceitação da existência do outro.
A
relação das sociedades latino- americanas com a Europa, uma relação em que a
América Latina aparece como dominados e a Europa como dominadores, é
justificada pela visão moderna da ontológia da totalidade – é a afirmação do
ser absoluto, do ser ‘igual ao eu’, é a negação da alteridade. ‘’Os filósofos
modernos criam uma filosófia do eu em que eu sou o único ser existente (uma
filosofia egoísta, dominadora) em que tudo e todos com quem se relaciona passam
a ser objetos’’. Esse argumento justifica o fato da Europa como dominadora e os
latino- americanos como dominados, esses não podendo reagir já que não são.
O
mundo estaria dividido em centros e periféria. E a paritr dessa configuração,
instala o sistema em que a Europa aparece
como único centro do mundo, justificando sua imposição cultural, e de valores.
Fora da totalidade desse sistema existe o outro a paritir da exterioridade (da
negação do ser como absoluto).
‘O
ser (do sistema) é; o não- ser (além do sistema) é real’, ou seja, além da
totalidade do sistema o outro é real, também existe.
Dessa
forma, segundo Dussel ‘’o não ser são os bárbaros, eles não são’’, e como só o
ser é, ‘’e o único mundo que é o que
tem domínio do todo’’. Isso se mantêm porque os que dominam divinizaram o seu
mundo de maneira que ele é ‘’eterno e natural’’, e aquele que é de outro mundo
não é, sendo ‘’interiorizado ao mundo como coisa’’. Essa é uma ontologia
ideologica em que nega a existência do Outro, esse sendo admitido apenas como
sendo um objeto a serviço do ser.
Isso
justifica a razão de haver tantas guerras e porque ela aparece como origem – as
guerras acontecem porque ainda que o homem seja dominado e se convensa de que
não é nada, em algum momento pode tentar escapar dessa alienação. O homem que
tenta escapar dessa dominação é considerado louco ou criminoso, está seguindo
por um caminho que não existe, portanto deve ser resgatado, assassinado pelo
sistema, isso ocorre de muitas maneiras – a mais eficaz seria a pedagogia; ou pela
repressão, como Dussel quando exilado no méxico; ou fisicamente, como foi
Sócrates. ‘’Ou seja, o não- ser é falso e o falso, é o contrário da verdade que
é o sistema’’.
E
assim o ser é, e seu mundo é único, essa afirmação ontológica foi utilizada
pela Europa para exercer sua dominação sobre a América Latina, e esses não
poderiam resestir a dominação já que não são. O não-ser de Dussel é o mundo
exterior ao mundo do ser, é o Outro, o Outro é o que está fora do sistema de
dominação ou que está nele como coisa, é o não-ser.
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